terça-feira, 22 de outubro de 2013

A ciência lê Chico Xavier: Linguista aponta coerência nas características de cartas psicografadas pelo médium

Uma investigação da área de linguística analisou as cartas psicografadas pelo médium brasileiro Francisco de Paula Cândido Xavier, o Chico Xavier (1910-2002). O estudo apontou marcas que diferenciam os supostos autores entre si e essas distinções mantêm coerência para um mesmo autor em cartas escritas em épocas diferentes. A pesquisa identifica ainda a doutrina espírita permeando esses escritos, além de mostrar peculiaridades do processo de transformação desse material em livro.

A autora é Cíntia Alves da Silva, que fez o projeto durante seu mestrado na Unesp em Araraquara. Ela teve orientação de Jean Cristtus Portela, professor da Unesp em Bauru. Sua dissertação se transformou em livro eletrônico na edição 2013 da Coleção Propg-FEU Digital, sob o selo Cultura Acadêmica da Editora Unesp. A obra, intitulada As cartas de Chico Xavier - uma análise semiótica, pode ser baixada gratuitamente em http://migre.me/ekc6p.

Para realizar a análise, Cíntia teve que criar um acervo de cartas psicografadas porque muitos desses textos foram publicados apenas uma vez e com baixa tiragem. Após coletar mais de 500 textos, a pesquisadora se limitou às "cartas de conforto" aos parentes do suposto autor falecido.

Entre os autores mais recorrentes, a linguista se ateve a três nomes: Augusto César Netto, Jair Presente e Laurinho Basile. Os três teriam vivido em meados dos anos 1970, e morrido jovens. Cíntia escolheu três cartas de cada autor, escritas em períodos que variam de 8 meses a 4 anos.

 
NOÇÃO DE AUTORIA

A metodologia empregada foi a semiótica, que é a ciência que estuda os fenômenos culturais como sistemas de significação. Esse recurso permitiu à pesquisadora analisar os procedimentos de organização do texto e não apenas frases isoladas. Cíntia utiliza a Escola Francesa, também chamada de greimasiana por ter no linguista lituano Algirdas Julien Greimas seu principal propulsor.

"Foi possível identificar claramente as marcas de cada autor e suas distintas personalidades", afirma a pesquisadora, que explica que o conceito da linguística chamado de "noção de autoria" se dá pela repetição de marcas textuais, desde as mais profundas (visão de mundo e objetivos na vida, por exemplo) até as mais superficiais (como gírias e outros registros de oralidade).

"O Laurinho, por exemplo, era mais dependente da mãe, e se mostrava muito delicado nas cartas, ainda muito abalado por essa separação. Já o Jair, que em vida era mais independente, tinha uma carreira estabelecida como professor, se mostra mais despojado, mais bem resolvido com sua morte", descreve.

Nos três casos, a pesquisadora afirma ter identificado a retórica religiosa, ou seja, a necessidade de propagar os conceitos espíritas. Ela exemplifica o que chama de "tom doutrinário" das cartas por sentenças como "é preciso evoluir", "é preciso superar", "devemos alcançar planos espirituais superiores".

Cíntia escolheu ainda uma décima carta, para examinar o processo de criação do livro.
"Os relatos que temos indicam que esses manuscritos eram precisos quanto a detalhes familiares e intimidades dos autores", explica. Ao levar as cartas aos livros, o editor precisava fazer notas de rodapé para passar esse repertório ao leitor - explicar quem são as pessoas mencionadas nas cartas, por exemplo.


UM OUTRO CHICO XAVIER

As cartas psicografadas marcam uma mudança drástica nos escritos de Chico Xavier. Antes delas, ele se dedicava a textos filosóficos sobre temas científicos, como Evolução em dois mundos, de 1958. A obra psicografada por ele em parceria com o médium Waldo Vieira, e cuja autoria é atribuída ao espírito André Luiz, trata da evolução das espécies.

A partir da publicação das cartas, a literatura espírita passa a ter uma linguagem mais simples e experimenta um crescimento notável. "A perda de um ente querido é um tema de difícil superação para todos, por isso as cartas foram determinantes para que Chico Xavier caísse no gosto popular", analisa a linguista.

Agora no doutorado, a pesquisadora analisa a psicografia como forma de escrita, o que, segundo Cíntia, representa um desafio em diferentes campos, como os da propriedade intelectual e o jurídico. "Há casos de cartas psicografadas que foram usadas no Brasil e no exterior como provas em julgamentos, por exemplo, assim como já houve disputas judiciais por obras psicografadas atribuídas a escritores falecidos", destaca.

Fonte: Matéria de Cínthia Leone. Jornal Unesp - Universidade Estadual Paulista. Ano XXVII, nº 291. Agosto 2013.

3 comentários:

  1. Adorei seu blog! Explicativo, com conteúdo e claro! vou divulgá-lo! parabéns por teu trabalho e por divulgar tais cartas... desconhecidas do público em geral. Chico era realmente um médium e um ser humano sem igual! Reconfortou tantas famílias... e levou a todos nós tantas palavras de fé e comprometimento.

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    1. Muito obrigada, Martin! Fico feliz que tenha gostado ;-) Grande abraço!

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  2. Fascinante sua matéria! Quero dizer que sou cirurgião e venho estudando muitas coisas relativas a temas da medicina, física, parapsicologia, biologia entre outras. À algum tempo, me dediquei ao pensamento ateísta, e de fato para mentes um pouco mais esclarecidas vemos que as leis naturais repercutem em tudo e indubitavelmente a religiosidade perde cada vez mais a sensatez. Tentei durante mais de 25 anos refutar as ideias relativas a Chico Xavier defendendo um ponto de vista explicativo em torno de seus poderes mediúnicos. São tantas evidências que minha busca mostrou em relação a veracidade dos fatos ocorridos que é de espantar ! E logicamente para uma mente condicionada a pensar em todas as hipóteses, é algo muito desconfortável. Nesse estudo pessoal que realizei percebo que a ciência é extremamente útil, mas ainda assim não fecha o diagnóstico, pois ao darmos crédito a ciência também corremos o risco de nos dogmatizar. Evidências não são provas, mas se tivermos uma quantidade absurda de informações a respeito de tal observância é difícil negar a situação. O exemplo pode ser visto claramente na biologia constatando-se a evolução das espécies. Não há provas, mas 1 bilhão de evidências, todas apontando para uma mesma direção. Ao analisar a mediunidade de Chico Xavier podemos chegar a essa mesma conclusão.

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